Passada a primeira rodada da Copa América 2019, o que mais se comentou não foi a bela vitória da Colômbia sobre a Argentina, nem o bom jogo entre Paraguai e Qatar ou as goleadas de Uruguai e Chile. O grande tema foi a baixa taxa de ocupação em dois terços dos jogos da primeira rodada. Como resultado, a taxa de ocupação na primeira rodada da Copa América 2019 é a mais baixa dos últimos 4 eventos, e a média de público é a segunda mais baixa.
Segundo vários pesquisadores, o principal apelo para assistir um evento esportivo pode ser a natureza única de uma competição atlética. Eventos esportivos representam uma experiência finita em que os resultados são desconhecidos antes do início da competição. Um evento esportivo é uma experiência hedônica e o evento em si pode provocar nos expectadores reações cognitivas e afetivas diversas em relação à performance do atleta ou da equipe (Hirt, Zillmann, Erickson & Kennedy, 1992; Sloan,1989, Wann & Branscombe, 1992).
Para Hansen e Gauthier (1989) as quatro categorias gerais dos fatores que influenciam no comparecimento do consumidor no estádio podem ser resumidas em: a) econômica, b) sócio demográfica, d) atratividade do jogo, e d) as preferências individuais. Segundo Boyd e Krehbiel (2003), os estudos sobre comparecimento aos estádios estão baseados nos aspectos econômicos (salários, PIB, população) e os efeitos da promoção no comparecimento do público no estádio em comparação às outras alternativas de entretenimento.
Existem vários fatores que influenciam no processo de tomada de decisão do torcedor em ir ao estádio. Fatores como horário das partidas, conveniência, a performance das equipes, qualidade do estádio, o preço do ingresso, as condições climáticas, outras alternativas de lazer entre outros, são os fatores mais importantes que influenciam na decisão do consumidor em comparecer ou não a um evento esportivo (Hansen & Gauthier, 1989; Wakfield & Sloan, 1995)
Partindo dos pressupostos acima, os estudos sobre comparecimento aos estádios estão baseados nos aspectos econômicos (salários, PIB, população) e os efeitos da promoção no comparecimento do público no estádio.
Na tabela abaixo podemos observar o salário mímimo e PIB per capta em dólar, dos quatro últimos países sede da Copa América e tambem da França, último país sede da Euro:
País |
Salário Mínimo (USD) |
PIB per Capta (USD) |
Argentina - 2011 |
302,00 |
12.763,00 |
Chile - 2015 |
378,00 |
13.737,00 |
EUA - 2016 |
1.160,00 |
57.588,00 |
França - 2016 |
1.628,00 |
36.870,00 |
Brasil - 2019 |
260,00 |
8.973,00 |
OBS: os valores foram convertidos com a taxa do dólar do período em que foi disputado o torneio.
Seguindo o racicionínio, segue abaixo os preços dos ingressos em dólar na fase de grupos em cada país sede:
País |
Mais Barato |
Intermediário |
Superior |
Mais Caro |
Jogos Argentina - 2011 |
20,00 |
36,00 |
|
84,00 |
Jogos Brasil - 2011 |
15,00 |
54,00 |
|
78,00 |
Jogos Chile/ Brasil / Argentina - 2015 |
24,00 |
85,00 |
|
131,00 |
Jogos Demais Seleções - 2015 |
20,00 |
51,00 |
|
71,00 |
EUA - 2016 |
|
63,00 |
|
|
França - 2016 |
28,00 |
61,00 |
116,00 |
161,00 |
Brasil - 2019 |
32,00 |
48,00 |
67,00 |
94,00 |
OBS 1: Os valores foram convertidos com a taxa do dólar do período em que foi disputado o torneio.
OBS 2 : Os preços da Copa América na Argentina foram baseados nos jogos da Argentina e Brasil
OBS 3: Nos Estados Unidos haviam estádios com 4 jogos e outros com 2. Foi tomado como preço médio do ingresso o valor do pacote e dividido pelo número de jogos por estádio.
Podemos observar algumas estratégias de precificação distintas:
Baseado nos itens acima e nos preços de ingresso de cada evento, é possível perceber que a maior diferença está nas entradas mais baratas, onde os ingressos da Copa América 2019 é o mais caro entre todos. Comparando os preços dos jogos das demais seleções de 2015 com 2019, também há uma boa diferença.
Entrando mais diretamente na situação encontrada após a primeira rodada da Copa América 2019, a primeira análise é dividirmos o salário mínimo e o PIB per capta vigente na época de cada torneio pelo preço do ingresso mais barato praticado em cada país sede. No caso da edição dos Estados Unidos, foi utilizado o preço médio de cada partida:
País |
Salário Mínimo / Ingresso Mais Barato |
PIB Per Capta / Ingresso Mais Barato |
Jogos Argentina - 2011 |
15,10 |
638,15 |
Jogos Brasil - 2011 |
20,13 |
850,87 |
Jogos Chile/ Brasil / Argentina - 2015 |
15,75 |
572,38 |
Jogos Demais Seleções - 2015 |
18,90 |
686,85 |
EUA - 2016 |
18,41 |
914,10 |
França - 2016 |
58,14 |
1.316,79 |
Brasil - 2019 |
8,13 |
280,41 |
Avaliando a tabela acima é possível perceber que a relação Salário Mínimo e PIB Per Capta x Ingresso mais barato na Copa América 2019 é a mais baixa entre todas as edições. Ao se comparar apenas o salário mínimo, o brasileiro poderia comprar quase a metade de ingressos do que um argentino, americano ou chileno. O francês poderia comprar sete vezes mais ingressos com seu salário mínimo. Em média o preço do ingresso mais barato variou de 2% a 6% do valor de um salário mínimo de argentinos, americanos, chilenos e franceses para 12% na edição brasileira.
Em termos de PIB Per Capta a situação se repetiu. O brasileiro poderia comprar metade de ingressos do que um argentino ou chileno para ver a seleção do seu país jogar. Para os demais jogos, o argentino e o americano poderiam comprar 3 vezes mais ingressos que o brasileiro. O francês poderia comprar quase cinco vezes mais ingressos.
Fica claro que, com base no PIB, salário mínimo e outras situações econômicas, a precificação dos ingressos da Copa América 2019 ficou muito fora do que dos nossos vizinhos Argentina e Chile. Devido ao poder aquisitivo de americanos, estrangeiros resindentes nos Estados Unidos e dos franceses, a estratégia adotada nesses dois países foi a mais adequada para o sucesso de público.
Apenas como um exercício, caso fosse adotada a mesma proporção de salário mínimo x ingresso da Argentina e do Chile na edição de 2019, o valor do ingresso mais barato seria algo em torno de R$ 70,00. Se adotada precificação diferenciada para jogos de outras seleções, o ingresso mais barato poderia ser de R$ 60,00. Valores bem mais acessíveis e compatíveis com a realidade da grande maioria da população brasileira.
Marcelo Paciello - Apaixonado por gestão e marketing esportivo. Mais de 10 anos como gestor de negócios, mestre e pesquisador em Gestão do Esporte especializado em marketing esportivo.
PARCEIROS