16/03/21

Planejar para dominar

Apenas quem viveu isolado em uma ilha remota no meio do Oceano Pacífico, sem qualquer acesso à televisão, internet, celular ou qualquer outra forma de comunicação, desconhece que Palmeiras e Flamengo são os clubes que mandam no futebol brasileiro desde de 2016.

Para evitar qualquer dúvida, o critério utilizado para determinar que os dois clubes “mandam” no futebol tupiniquim foi a consistência com a qual ambos lutam pelo título dos campeonatos que disputam. O histórico recente não deixa mentir: o Palmeiras, além da Copa do Brasil de 2015 – título que precedeu esse período de ascensão do verdão –, conquistou os Brasileiros de 2016 e 2018, a Libertadores de 2020, a Copa do Brasil de 2020 e o Paulista de 2020; já o Flamengo conquistou os Brasileiros de 2019 e 2020, a Copa de Brasil de 2017, a Libertadores de 2019, e os Cariocas de 2017 ,2019 e 2020.
Palmeiras e Flamengo campeões da Libertadores da América levantando a taça

O domínio de ambos é incontestável, tanto que o único incômodo real tem partido do Grêmio, que também passou por um processo de reorganização administrativa e, com isso, colheu diversos frutos esportivos – Copa do Brasil de 2016, Copa Libertadores de 2017, e o tricampeonato gaúcho (18/19/20).

O caminho para o sucesso esportivo de Palmeiras e Flamengo foi pavimentado a partir do momento em que a dupla decidiu revolucionar a forma como era administrada. O amadorismo deu lugar ao profissionalismo que permitiu aumentar a arrecadação, reorganizar as finanças, melhorar a estrutura do centro de treinamento dos profissionais, potencializar a formação de atletas – a famosa categoria de base – e, consequentemente, investir em melhores contratações.

É evidente que o caminho para o sucesso não veio com facilidade. O Palmeiras, por exemplo, precisou cair em 2012 – quase repetindo o roteiro em 2014 –, para, a partir de então, colher os frutos do trabalho iniciado por Paulo Nobre. O Flamengo, apesar de não ter caído para a série B, sofreu com times de qualidade duvidosa durante o mandato de Eduardo Bandeira de Mello (2013 a 2018). Apesar das inúmeras críticas pela economia na montagem do elenco, o mandatário rubro-negro sempre justificou a mão fechada pela necessidade de equilibrar as finanças. A responsabilidade financeira deu resultado e, desde 2018, o Flamengo figura como postulante a praticamente todos os títulos que disputa – tendo em 2019 o ápice desse projeto iniciado em 2013.

Os louros esportivos, no entanto, não podem mascarar os erros que os dois clubes cometeram na gestão esportiva, os quais possivelmente diminuíram o domínio que a condição de ambos permitia.

Comecemos pelo Palmeiras que, curiosamente, jamais começou e terminou os anos vitoriosos – de 2016 para cá – com o mesmo técnico. Os títulos sempre vieram após a troca de treinador no meio do ano. Em 2016, Cuca substituiu Marcelo Oliveira, que havia conquistado a Copa do Brasil no ano anterior, e venceu o Brasileiro. Em 2018, foi a vez de Felipão substituir Roger Machado e levantar a taça de Campeão Brasileiro. Até mesmo o épico e inesquecível 2020 veio com a troca do contestado e ultrapassado Luxemburgo por Abel Ferreira.

Os mesmos vícios podem ser vistos no Flamengo. Em 2019, ano do ápice da hegemonia flamenguista, o português Jorge Jesus, até então desconhecido por Landim, assume a equipe no lugar de Abel Braga, tão contestado e ultrapassado quanto Luxemburgo, para conquistar o Brasileiro e a Libertadores – parando no Liverpool, que teve sua revanche pelo mundial de 81 perdido para o Flamengo de Zico e companhia. Em 2020, ano do bicampeonato brasileiro, o cenário se repetiu, mas dessa vez com o estrangeiro (Domènec) dando lugar ao brasileiro (Rogério Ceni).
Luxemburgo, Abel Ferreira, Jorge Jesus e Abel Braga, os técnicos que dançaram e assumiram Palmeiras e Flamengo

Os torcedores certamente dirão que as trocas foram positivas – como de fato foram – pela conquista de inúmeros títulos. Tal sucesso, contudo, não pode mascarar os efeitos da má escolha de um projeto esportivo e como ela pode afetar um domínio que poderia ter sido ainda maior.

Ainda que seja necessário transitar no campo do “e se” – a tratando-se, portanto, de um exercício imaginativo, caso Flamengo e Palmeiras tivessem apostado no desenvolvimento de um projeto esportivo mais sólido e duradouro – capaz de ajudar na implementação de uma filosofia para servir como guia –, possivelmente os dois clubes teriam obtido resultados mais rápidos, por exemplo, na Copa Libertadores.

A ausência de um projeto sólido pôde ser vista no Flamengo de 2020. Após a repentina saída de Jorge Jesus, além de não ter quem comandasse o clube durante o vácuo no comando técnico – a perda de performance pela queda na preparação física foi gritante –, a contratação de Domènec Torrent foi um tanto quanto controversa pela diferença de estilos e pela pouca experiência do catalão como técnico principal. Tal combinação demandava paciência da direção rubro-negra para que o trabalho eventualmente pudesse engrenar.

Porém, o futebol brasileiro, assim como na vida, não consegue largar certos vícios, sendo um deles a impaciência. Depois de um duplo quatro a zero para São Paulo e Galo, a direção rubro-negra demitiu Domènec e apostou em Rogério Ceni. A troca foi parcialmente exitosa pelo título brasileiro – mais pela incompetência da concorrência do que por méritos do Flamengo. O êxito parcial está no fato de o elenco permitir que o Flamengo vencesse Libertadores (caiu para um mediano Racing) e Copa do Brasil (eliminação para o São Paulo, algoz rubro-negro em 2020).

Caso houvesse consistência no planejamento do projeto esportivo, não restam dúvidas de que o Flamengo poderia ter atingido – e talvez até superado – o sucesso de 2019 em 2020.

Valendo-se novamente de uma analogia com a vida, aprende-se no futebol com erros e acertos. Espera-se, assim, que a dupla tenha aprendido com os erros do passado e que Abel Ferreira e Rogério Ceni sejam o início de uma forma de pensar que vá além da mera ocupação de espaços na sala de troféus.

Twitter - Advogado, futebolista de ocasião e amante de todos os aspectos do futebol - dentro e fora de campo!


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